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Rosana Paulino: Novas Raízes
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Ana Costa Ribeiro, Laura Erber, Leila Danziger e Regina de Paula

Curadoria e pesquisa
Galeria Aymoré, RJ/BR
Out-Nov. 2019

Texto Curatorial

“Nos abandonou e se foi, mas nós, os vivos, te cobrimos em um casulo (...)”
A cor do Romã (1969), Sergei Parajanov.

Séculos após a instituição da reprodutibilidade impressa como forma majoritária de veiculação de informação, nos encontramos chafurdados em uma imensidão de substratos. Eles, que nos proporcionaram novas relações com o mundo, prometendo- nos um incessante deslocamento, parecem tornar-se cada vez mais frágeis à medida que

encaramos sua efemeridade intrínseca, tanto no que diz respeito ao seu enunciado como em sua materialidade. Ainda que os meios de disseminação do saber promovam um discurso calcado na transparência do suporte, este se manifesta em sua precariedade, sinalizando o desejo de lançar-se no abismo voraz do nosso tempo ao passo em que a sua presença se multiplica.

O recorte escolhido nesta seleção permeia vídeos que lidam com impressos pessoais ou não, a partir de rearranjos estéticos e simbólicos. Refutando a condição de mero meio informativo, representacional ou arquivístico, aos quais os elementos presentes nos trabalhos se prestam usualmente, os gestos efetuados pelas quatr artistas promovem diferentes leituras dos impressos, perpassando, antes de tudo, a sua objetualidade. Material de análise na pesquisa artística das selecionadas, ele se torna opaco enquanto problema, expressão, matéria quase pictórica. Graças ao seu nov estatuto, podem desempenhar outras funções, desvelando e tensionando suas características.

No trabalho de Laura Erber, História Antiga (2005), a artista realiza diversas experimentações com o objeto-livro, tensionando suas condições de desfrute em um interessante encadeamento com a poesia e o vídeo. Por meio do uso de projeções e reinserções físicas, o impresso apresenta-se um eterno desajuste, seja em sua configuração de exibição, seja no jogo entre o orgânico e o inorgânico. A poesia se faz presente também em Pallaksch Pallaksch (2007-2010) de Leila Danziger, onde jornais devaneiam pela cidade, deixam-se molhar pelas ondas do mar ou são apenas observados enquanto dobram-se e se recusam a desempenhar qualquer função objetiva de meio. Essas imagens são sobrepostas a registros do gesto da artista de retirar informações de jornais com uma fita adesiva, obtendo novas composições que guardam uma similaridade com as ruínas da memória pública. Na trilha sonora, o poema de Celan é proclamado por uma voz masculina. Já em Como o Pó que o vento leva (2015-2016), Regina de Paula repousa uma bíblia em um peitoril de uma seteira, no Rio de Janeiro. As páginas, deixando-se levar pelo vento que chega da baía de Guanabara, prostram-se diante ao mar, marcando ali camadas da história que perpassam a colonização brasileira. Por último, o filme Arpoador (2014), de Ana Costa Ribeiro, narra um relato da relação de sua família com o arpoador, em uma reflexão que se dá após a perda da mãe. Em planos seguidos, o pai carrega uma fotografia de sua esposa, alocando-a em diferentes paisagens possíveis de se estabelecer em uma zona costeira. A foto, além de marcar a ausência de sua mãe, torna-se antes de tudo elemento constitutivo da paisagem, como que em uma fusão entre matéria e memória.

A fim de não ceder ao frisson do montante produzido ao longo da história, é preciso promover novas perspectivas acerca de todo esse material que nos ronda. A prática, que quase libera o suporte para exercer outras práticas, parece suscitar, ironicamente, um retorno à poesia. Não à toa, três das quatro artistas presentes fizeram da escrita poética um ofício. O poeta Paul Celan exprimiu certa vez que a poesia podia ser encarada como “uma espécie de regresso à casa”. Essa casa, no entanto, revirada pela investigação por meio dos vídeos aqui exibidos, não é mais a mesma. Afinal, quais os agenciamentos passíveis de serem obtidos ao tornar papéis turvos pela água que os submerge, mareados pelos ventos do além-mar que adentram parapeitos, porosos como cada grão de areia que surge na costa ou, ainda, fragmentados e dilacerados em rasgos? Cabe ao encontro vertiginoso entre obra e espectador nos revelar.

curadoria e pesquisa

lucasalbuquerques@gmail.com