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Terraço Coberto


Arthur Palhano

Projeto de curadoria e pesquisa
Casa do artista, RJ/BR
Jul. - Ago. 2021

Texto Curatorial

Uma planta é sempre um projeto por vir. Anuncia a aparição de uma estrutura que ameaça transformar a paisagem como a conhecemos originalmente. Para além da bravata anunciada, opera ainda um embate entre o dentro e o fora: a carapaça arquitetônica que se impõe ao outro e a organização relacional que germina no interior da conjugação dos cômodos. Entre a divisão domiciliar do quarto e da sala, a desproporção do aposento do casal frente ao dos filhos e a coreografia cotidiana dos fluxos que atravessam a casa, vê-se delineado não apenas um espaço de habitação, mas uma economia de relações. Um mapa de afetos.

Erguida a casa, decidimos abrir suas portas para o público em vista da realização da exposição Terraço Coberto, nome este cravado na planta residencial que nos encontrou ao longo do processo de pesquisa. A decisão de situar a primeira individual de Arthur em um espaço privado, longe dos preceitos evocados pelo cubo branco das galerias e museus de arte, tornou-se um mote para a feitura de um projeto que colocasse em jogo uma certa noção de individualidade imposta pelo ambiente pessoal em diálogo com a série de pinturas realizadas para cá, onde o artista representa objetos do cotidiano – como flores de plástico, espelhos e frutas. Temas envoltos em uma carga de banalidade que beira a apatia, mas que permitem a desenvoltura de uma linguagem pictórica que busca se afirmar em uma relação, à primeira vista, puramente material.

A aspiração à pureza formal, contudo, é perturbada por um artista que se afirma ao avesso: O nome, assinado obsessivamente diversas vezes, se utiliza da caligrafia pessoal para encontrar, a cada versão, uma possibilidade de fuga e reinvenção de si; a mão do autor, transposta à tela, recoloca o índice de sua própria manufatura, chamando a atenção pro que não subsiste, mas ainda assim insiste em escapar do seu tempo de origem; o espelho em sua nudez abissal, incapaz de refletir senão as pinceladas vibrantes do seu produtor. O ofício laborioso da pintura, encerrado no sem fim do gesto pictórico, é transformado em um exercício de existência.

Às pinturas somam-se objetos e instalações que buscam se relacionar com os recortes originais da casa. O quarto de casal é solo fértil para a ascensão de uma única peça, que reúne em si um composto de dualidades – masculino e feminino, sagrado e profano, obra e processo. O quarto de solteiro abre-se, com todas as resistências a que tem direito, para um conjunto de obras que instituem o fracasso (ou, ainda, o tropeço) como proposta relacional. Já a cozinha agrupa trabalhos pictóricos e instalativos cujas proposições se tecem em uma proposição de tempo dilatado e impositivo, banhando esta exposição no tiquetaquear ritmado de um metrônomo.

Ainda que esta exposição coloque o ambiente privado   e doméstico como uma possibilidade de exploração artística, não furtamos a possibilidade do decoro em virtude de uma exterioridade ostensiva. Enquanto alguns cômodos reservam ao visitante apenas a porta fechada, outros permitem a abertura parcial, estendendo um convite. A permissão de entrada compreende concessões e privações, assim como o ato artístico em si.

Links e material adicional

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curadoria e pesquisa

lucasalbuquerques@gmail.com